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Bons sentimentos, maus sentimentos

de Vera Mantero para o PEPCC - Forum Dança, 2009

Quando em 1872, Darwin escreveu “The expression of emotions in man and animals”, a ideia forte do seu trabalho centrava-se na procura de um padrão expressivo das emoções, comum entre seres humanos e animais e mesmo entre seres humanos de diferentes origens culturais e raciais. Esta ideia de estudar o comum e o universal no território das emoções contextualizava-se numa visão do mundo de tipo enciclopedista e positivista, na qual o psicológico e o afectivo eram alguns dos novos pólos de interesse e curiosidade científica. Aplicar os procedimentos da etologia ao campo dos comportamentos humanos era a divisa de um pensamento ancorado sobre a ideia de tudo poder conhecer e compreender no mundo, mesmo a mais vasta e complexa teia de sentimentos e expressões humanos.

Hoje em dia, embora essa ideia de quantificação e classificação universal seja anacrónica, sabemos como foi decisiva para a criação de uma atenção sobre a experiência do sentir, até então reservada a uma esfera privada, ou quanto muito invisível/inacessível ao pensamento científico.

E se hoje dificilmente separaríamos a expressão das emoções da sua construção cultural, sabemos bem como os processos mecânicos e biológicos do corpo - choro, riso, respiração, etc – são base comum para a construção de linguagens emocionais inteligentes e reconhecíveis entre grupos humanos, sujeitas a contágios infinitos entre o pessoal e o colectivo, entre os indívíduos e a sua cultura. E a expressão facial é talvez o lugar mais concreto dessa administração da emoção pessoal para a comunicação com o mundo exterior. A cara é o cartão de visita do interior para o exterior.

Bons sentimentos, maus sentimentos vai ao encontro dessa ideia de contacto infinito entre a expressão física das emoções e a sua expressão simbólica e colectiva. Tendo como ponto de partida uma oscilação entre gestos reconhecíveis de grande interesse, simpatia e curiosidade e, inversamente, gestos de rejeição, aversão, raiva ou repugnância, as formas reconhecíveis transitam e suspendem-se nos seus extremos, transformando-se numa estranha língua de estados efectivos intensos e sem história. Em Bons sentimentos, maus sentimentos temos a possibilidade de experienciar aquilo que emerge de determinadas emoções, quando as submetemos a uma lógica de saturação, exaustão, contaminação ou mesmo descontextualização. É um trabalho em torno da estrutura das emoções como um processo infinito de empatia, que faz do nosso corpo um espaço comprometido entre impressões e expressões, entre a fugacidade e o que perdura, entre si e os outros. Comunicação silenciosa de instantes reconhecíveis e irreconhecíveis que trazem a profundidade de uma emoção à superfície do rosto.

Rita Natálio

 
No final dos dois anos de formação, os alunos do Programa de estudo, Pesquisa e Criação Coreográfica – PEPCC participam no processo de construção e interpretam uma nova criação de vera Mantero. Estes quinze alunos, de oito nacionalidades, terminam assim um processo formativo dirigido por destacados artistas e professores internacionais. O confronto com o público foi, ao longo desta formação, realizado em vários formatos e resultado de diferentes propostas criativas. Vera Mantero, também professora de Improvisação e Composição Coreográfica durante o PEPCC, dirige agora a última experiência de apresentação deste grupo de alunos.

O Programa de estudo, Pesquisa e Criação Coreográfica – PEPCC é um projecto pedagógico e um projecto artístico. É uma formação avançada e intensiva em dança contemporânea. O PEPCC proporciona um conhecimento e uma prática constantes e inscritos num largo espectro de experiência e de conhecimento artísticos. Contextualiza este trabalho no universo alargado da produção coreográfica ocidental. Encoraja e fornece instrumentos aos alunos para o desenvolvimento de uma postura crítica e reflexiva em relação a si e à realidade criativa actual. Promove cruzamentos com outras artes e esferas do conhecimento. O PEPCC pretende criar as condições para uma integração na comunidade artística profissional da dança contemporânea, promovendo a autonomia e a confiança no esboço de uma trajectória individual na área interpretativa ou criativa.

Ficha Artística

Direcção artística
Vera Mantero

Co-criação e interpretação
Acerina Ramos, Ali Moini, André Soares, Cinira Macedo, Claudia Tomasi, Francisca Santos, Jonas Vanhullebush, Julia Salaroli, Kandyê Medina, Maria Lemos, Mariana Bártolo, Mariana Tengner Barros, Natalia Viroga, Sezen Tonguz, Teresa Silva

Colaboração dramatúrgica e assistência de ensaios
Rita Natálio

Figurinos e cenografia
André Guedes

Desenho de Luz
Thomas Walgrave

Som e música
Rui Dâmaso

Coordenação de produção
O Rumo do Fumo

Produção
Forum Dança

Co-produção
Culturgest

Cronologia

28 - 29 Novembro 2009, Palco do Grande Auditório, Culturgest, Lisboa/Portugal

Estreia - 4 Fevereiro 2009, Teatro Helena Sá e Costa, Porto/Portugal